Unidos, somos Mercosul

Se a América Latina tem alma – e seu sonho de ascensão é o fim da desigualdade entre seus povos – ela hoje se angustia na busca de saídas contra o avanço das forças do retrocesso.

O atraso tem nome. A chegada à presidência do direitista e defensor dos torturadores Maurício Macri, na Argentina; de Michel Temer e sua quadrilha golpista jurídico, parlamentar midiática no Brasil; de Horacio Cartes, no Paraguai, banqueiro e dono de mais de 20 empresas de produtos ligados ao atraso da humanidade como cigarros e refrigerantes.

Está seriamente ameaçada a lufada fresca de democracia com conquistas como o fim da miséria e mais direitos sociais para milhões de pessoas no Brasil, de Lula e Dilma; na Argentina, de Cristina Kischner; no Uruguai, de Pepe Mujica; no Paraguai, de Fernando Lugo; na Bolívia, de Evo Morales; no Equador, de Rafael Correa; na Venezuela, de Chavez.

O trabalho da diplomacia americana nestes países surtiu efeito. Aliados à mídia golpista tentam convencer ao mundo que o povo da América Latina é contra governos democráticos.

Dão apoio financeiro e assessoria para a mobilização da direita; a montagem de protestos de ruas em aliança com grupos fascistas e religiosos radicais do atraso; a contratação de mercenários instruídos a quebrar e incendiar em manifestações pacíficas.

A luta pela posse da presidência do Mercosul faz parte deste teatro de horrores. É apenas parte da estratégia global das elites de fazer a América Latina voltar a ser colônia do imperialismo.

Tudo indica que a sabotagem ao Mercosul e à integração regional represente para Serra a semente da ALCA, Área de Livre Comércio das Américas, o sonho de consumo do chanceler tucano interino golpista, e da oligarquia colonizada do Brasil.

Tão recentes no poder e já tão articulados. O trio José Serra, Suzana Malcorra, a chanceler argentina e Eladio Loizaga, o chanceler paraguaio, falam absolutamente a mesma língua.

O interesse das forças do retrocesso é claro: paralisar e enfraquecer o Mercosul, símbolo de união do continente sob a égide de governos de esquerda, sonhando o mesmo sonho de uma América Latina unida e forte.

Se uniram para impedir que Maduro ocupe a presidência rotativa do Mercosul, sob a alegação de que o país vive em estado de ” tensão e de descumprimento de princípios universais e direitos humanos”.

Ora, ora, ora… e o que vive o Brasil? com o afastamento de uma presidenta eleita democraticamente por 54 milhões de brasileiros, num processo onde não existe crime nem de responsabilidade nem de nenhuma espécie, montado e votado por um Congresso onde mais da metade dos parlamentares não passa no teste da lei da Ficha Limpa e vivem se borrando de medo das ameaças do cupincha de Temer, Eduardo Cunha, de delata-los para salvar sua pele.

Trata-se de pura hipocrisia. Não há como negar o direito de Maduro. O Tratado de Assunção, documento de fundação do bloco, assinado em 1991, afirma em seu artigo 12 que “a Presidência do Conselho se exercerá por rotação dos Estados Partes e em ordem alfabética, por períodos de seis meses”.

O mesmo reza o Protocolo de Ouro Preto, assinado quatro anos mais tarde como complemento estabelecendo que o Tratado de Assunção fosse reconhecido juridicamente e internacionalmente como uma organização. Seu artigo 5º estabelece que “A Presidência do Conselho do Mercado Comum será exercida por rotação dos Estados Partes, em ordem alfabética, pelo período de seis meses”.

Ou seja, a combinação destas duas normas do MERCOSUL fixando o prazo semestral de duração do mandato temporário, e o critério de nomeação automática da presidência por ordem alfabética –garante, naturalmente, a posse do governo venezuelano para conduzir o bloco no segundo semestre de 2016.É uma questão de matemática simples.

Concordo plenamente com a posição da Venezuela de rejeitar a reunião de coordenadores proposta pela Argentina visando resolver “divergências” em torno da presidência do Mercosul e ter declarado oficialmente que está no exercício pleno da presidência ‘pro tempore’ do Mercosul, medida inclusive aprovada pelo governo uruguaio.

Que divergências? Elas só existem na cabeça da tríplice aliança golpista Serra, Malcorra, Loizaga. Elas foram criadas pela direita unida para acabar com a democracia na América Latina e instituir como lei o entreguismo barato onde somente eles como representantes das elites saem lucrando.

A proposta argentina de se reunir para discutir a questão foi merecidamente ridicularizada pela ministra venezuelana das Relações Exteriores, Delcy Rodríguez.

Em entrevista à rede de televisão Telesur ela disse: “Nos preocupa como Susana Malcorra, que pretende ser secretária-geral das Nações Unidas, desrespeita os tratados internacionais.”

Que os direitistas continuem esperneando e insistindo que o comando do bloco está vago e que Nicolás Maduro não está em condições políticas nem econômicas de assumir a presidência do Mercosul, devido à crise interna que atravessa o país e pelas denúncias de violações de direitos humanos.

Se Maduro não pode assumir por viver o país numa crise econômica, Macri também não. Sua popularidade caiu mais de 10% desde sua posse, impondo aos argentinos um tarifaço, inclusive nos combustíveis, causando ao país uma inflação em torno de 19% acumulado entre janeiro e abril deste ano. As agências internacionais que ele tanto ama rebaixaram a nota do seu país.

O povo argentino está descontente e não perde oportunidades para se manifestar nas ruas. Nasemana passada médicos, funcionários do judiciário e professores fizeram paralizações em todo o país por reajustes salariais.

No Brasil, com a contribuição inequívoca de Temer, Serra e as bênçãos do Tio Sam, se o impeachment passar no Senado, não estaremos, daqui pra frente, em melhor situação que nossos parceiros do Mercosul.

Como afirma o cientista político Emir Sader, o país estará reduzido a cinzas, socialmente desintegrado e explosivo politicamente, com a rejeição de toda a população ao governo, ao Congresso e ao Judiciário.

Nada mais assustador. Os golpistas podem até conseguir fazer o impeachment passar no Senado em sua fase final mas conseguir governar não vão. Ou seja, estão longe de poder usurpar a presidência do Mercosul de Maduro alegando estarem em melhores condições.

Chico Vigilante

Deputado Distrital do PT