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Artigo: SENHORES SENADORES, NÃO PERMITAM QUE SE RASGUE A CLT

Assistimos em 8 de abril a um dos mais tristes dias vividos pelo Congresso Nacional quando deputados autorizaram que se rasgue a CLT ( Consolidação das Leis do Trabalho ) feita na década de 40, garantindo direitos mínimos aos trabalhadores no Brasil. O que o Congresso Nacional está fazendo é crime.

Ao aprovar um projeto de lei que regulamenta e amplia a possibilidade de terceirização das contratações no mercado de trabalho brasileiro, por 324 votos a favor, 137 contra, e 2 abstenções, sem garantir aos terceirizados conquistas já alcançadas anteriormente, a Câmara dos Deputados provou que uma parte de seus membros está despreparada e desinformada sobre a questão e a outra tem lado próprio: é simplesmente contra os interesses do trabalhador.

Sou deputado distrital mas estou licenciado como trabalhador de uma empresa terceirizada. Conheço de perto esta questão.
Como o texto final da Câmara seguirá ao Senado, e somente depois disso irá para sanção ou veto da presidenta Dilma, convoco a sociedade brasileira e estar presente na próxima terça-feira para a votação dos destaques, ou seja, a discussão de detalhes específicos do projeto que ainda podem ser alterados.

O projeto aprovado pela Câmara, criticado pelo PT e por centrais sindicais, e elogiado por empresários e seus defensores, como Eduardo Cunha, permite que empresas contratem trabalhadores terceirizados, amplia o leque de funções hoje permitidas para esta modalidade ( como limpeza e segurança ) e prevê a terceirização tanto em empresas privadas como públicas.

Esse tipo de contratação, atualmente permitida somente para a chamada atividade-meio, poderá também ser utilizada na atividade-fim da empresa. Uma clínica ou uma universidade, por exemplo, hoje pode terceirizar serviços de limpeza e segurança, mas não contratar médicos e professores terceirizados. Pelo texto votado na Câmara, essa limitação deixará de existir.

A parte daqueles que na Câmara agem declaradamente contra os interesses do trabalhador afirmam unanimemente que a regulamentação dos contratos de terceirização trará “segurança jurídica” para as empresas. Esta é uma balela defendida pela direita mais atrasada.

O que eles querem com a institucionalização da precarização das leis trabalhistas para os terceirizados é que estes fiquem impedidos de ingressar na Justiça contra as empresas que desrespeitam seus direitos, como acontece hoje.

Apesar de que nem todos os trabalhadores entram na Justiça por temer passar a integrar a lista negra, o que condena o trabalhador a não arrumar mais emprego.

Ali colocam o nome de todos aqueles que recorreram à Justiça contra uma empresa terceirizada para que não sejam mais admitidos em nenhuma delas.

Fiquei impressionado com a irresponsabilidade dos demais deputados ao aprovarem esta lei, sem nem ao menos se darem ao trabalho de entender os principais problemas dos trabalhadores terceirizados. Apenas entraram no jogo de confrontrar o Executivo.

Não precisavam ir longe. Se tivessem perdido dois minutos para conversar com os trabalhadores da limpeza e da segurança da própria Câmara, não teriam votado a favor do projeto.

Acompanho esta situação desde meus mandatos como deputado federal quando juntamente com os deputados Inocêncio de Oliveira, Sigmaringa Seixas e o diretor geral da Casa, Dr Sabino, conseguimos garantir um mínimo de direitos para o trabalhador terceirizado no Congresso. Mas ainda há muito o que conquistar.

Sei de trabalhadores terceirizados dentro da Câmara que estão há anos sem tirar férias, porque cada vez que uma empresa terceirizada perde o contrato e outra terceirizada entra em seu lugar, os trabalhadores ficam sem ter férias e sem receber seus direitos. É um verdadeiro modelo de escravidão.

Muitas vezes no Brasil, fiscais e auditores do trabalho vão a fazendas em áreas remotas no interior do país investigar denúncias de trabalho escravo, mas não enxergam o que está acontecendo na capital da República, nas barbas da Justiça: trabalho sem o pagamento das garantias mínimas previstas na CLT, como férias, décimo terceiro e recolhimento para a Previdência.

Milhares de empresas entram em falência ao longo dos anos e os trabalhadores ficam sem receber absolutamente nada. Me lembro de duas grandes empresas de segurança com atuação em todo o Brasil, a SEG- Serviço Especial de Guarda, e a SELENEN- Serviço de Vigilancia Técnica, que quebraram, desapareceram do mercado e até hoje seus trabalhadores estão sem receber.

O Congresso Nacional deveria discutir com seriedade o problema da terceirização de mão de obra do Brasil. Se quisesse mesmo fazer isso, o primeiro passo seria votar uma legislação fixando o que é terceirização, determinar os parâmetros para se considerar uma empresa terceirizada. Uma das exigências imprescindíveis deveria ser ter capital próprio.

No caso da vigilância isso já é fixado. Para se abrir uma empresa de vigilância há que comprovar capital próprio, ter nacionalidade brasileira, e não haver respondido a nenhuma ação cível criminal.

Se este projeto for aprovado como está, os demais terceirizados vão poder ser contratados por empresas de fachada, cujo escritório é uma pasta 007. Sempre digo que terceirização é um nome moderno que encontraram para classificar a crueldade contra o trabalhador.

Na verdade se formos resumir a situação da terceirização no Brasil podemos dizer que é um conjunto de empresas pobres, trabalhadores miseráveis e empresários milionários, porque eles, os reais empresários da terceirização, nunca colocam nada no nome deles.

Quando vejo os altos dirigentes da FIESP, da CNI, empresários e deputados chamando isso de modernização fico chocado. Na verdade isso é a legalização da exploração, de maneira vil. Querem discutir modernização ? Os trabalhadores estão dispostos a discutir.

O parlamento brasileiro tem uma maneira peculiar de transformar boas ideias em coisas ruins. A proposta do ex deputado petista Adão Pretto, morto em 2009, de se criar cooperativas no campo para o pequeno produtor, trabalhador sem terra, transformou-se em coopergatos.

Quando o Lula assumiu tínhamos na Esplanada empresas com o nome de cooperativas, com sede em Brasília e escritório em Boston, nos EUA, explorando mão de obra terceirizada, sem férias, sem décimo terceiro, nada . Ele acabou com isso. Vamos permitir novamente a volta da Idade Média para o trabalhador ?

A sociedade brasileira deve checar a lista dos inimigos dos trabalhadores que votaram pela aprovação do projeto e comparecer à Câmara dos Deputados na próxima terça-feira para acompanhar a discussão e pressioná-los a melhorar pontos específicos do texto, em defesa dos trabalhadores terceirizados.

É importante garantir aos terceirizados no novo projeto o que com a nossa luta de anos consegui garantir aos vigilantes. Ainda na era do ministro Waldeck Ornelas, da Arena, da Bahia, eu como presidente do Sindicato dos Vigilantes do DF, procurei o ministro e pedi para que o Ministério da Previdência bloqueasse o recurso previdenciário que as empresas cobravam do trabalhador, embolsavam e não repassavam à Previdência.

Desta forma davam o calote na Previdência e no trabalhador ao mesmo tempo, uma vez que assim ele não teria como comprovar tempo de serviço para aposentadoria.

O ministro entendeu a importância de minha reivindicação e determinou a medida para as empresas terceirizadas de vigilantes e trabalhadores da limpeza.

Ou seja, o projeto atual é tão mal pensado que permite a terceirização para todas as categorias e nem sequer determina a obrigatoriedade do que hoje a lei já garante aos vigilantes e pessoal da limpeza: que a contribuição beneficiária recolhida deles seja bloqueada em conta especial para que em caso de mudança de empresa ou falência da terceirizada o montante seja repassado à Previdência garantindo ao terceirizado contar tempo de serviço para sua aposentadoria.

Hoje o trabalhador só consegue se aposentar se ficar comprovado que pagou as parcelas previdenciárias. Portanto, se este projeto absurdo passar os trabalhadores terceirizados poderão até perder o direito de se aposentar, serão a última classe dos trabalhadores em termos de benefícios sociais.

A lei deve assegurar minimamente que o tomador do serviço continue respondendo subsidiariamente pelo trabalhado, que é o que já acontece hoje. De acordo com uma resolução do Superior Tribunal do Trabalho, no caso de uma empresa terceirizada desaparecer e não pagar os direitos do trabalhador, o órgão tomador do serviço, ou seja, o contratante da empresa terceirizada, tem que pagar o trabalhador.

Da maneira que a nova lei foi estruturada esse direito acaba também.

Portanto, espero que o Senado, por sua vez, não permita a legalização da exploração do trabalhador terceirizado e que, os senhores senadores, num lampejo de lucidez reflitam sobre este crime para que injustiças possam ser corrigidas.

A ideia deste projeto maléfico foi do então deputado Sandro Mabel, que era dono da indústria Biscoitos Mabel. Ele queria terceirizar para ter mais lucro e era também dono de empresa de vigilância.

Os trabalhadores iam na Justiça buscar seus direitos e ele era obrigado a pagar, então idealizou esse projeto exclusivamente buscando benefício próprio e garantindo que a lei permitisse este tipo de absurdo.

O projeto levou 11 anos tramitando na Câmara e agora Eduardo Cunha, que demonstra não ter compromisso nenhum com os trabalhadores e nem com o governo, do qual se diz aliado, decidiu ressuscitar esse projeto Frankstein.

Conclamo mais uma vez a sociedade, o Congresso Nacional e os empresários de bom senso deste país, a lutar contra este desrespeito ao trabalhador terceirizado. O projeto reduz os salários e os fundos de seguridade social. É a ruína de cerca de 12 milhões de trabalhadores prestadores de serviços no país, e péssimo para o futuro do Brasil.

Deputado Chico Vigilante