Vencida a etapa de que as manifestações de rua contra Dilma não cresceram e que, portanto, não haverá impeachment a partir daí, é necessário que se redirecione a energia de transformação.
Para a infelicidade de seus organizadores, os protestos de rua de 12 de abril contra Dilma encolheram. É inegável. Isso aconteceu basicamente por duas razões: os movimentos que tentam direcionar as manifestações tem objetivos diversos – volta da ditadura, ou manutenção da democracia; e seus participantes não se igualam culturalmente, muitos deles desconhecendo minimamente o funcionamento e as atribuições dos poderes instituídos no país.
Ao contrário, as manifestações realizadas em pelo menos 18 estados pelas centrais sindicais e sociedade organizada, apenas três dias depois, no 15 de abril, contra a regulamentação da terceirização já surtiram seus efeitos. O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, adiou a votação do projeto (PL 4330/04), o que permite que os movimentos sociais tomem fôlego para pressionar o Congresso sobre pontos importantes em discussão no projeto.
O que necessitamos no Brasil neste momento é de um movimento popular coeso em torno de uma pauta progressista. Isso impõe resultados. Movimentos festivos, difusos e contagiados por facistas levam, no máximo, à violência e ao atraso.
A maioria dos manifestantes do dia 12 de abril estão insatisfeitos mas não tem consciência real sobre se o que pedem vai realmente melhorar o país. Não imaginam que caso Dilma seja retirada a força ou por meio de um impeachment os piores problemas da grande maioria dos brasileiros estaria apenas começando.
Perguntar a muitos deles o que significa ser de direita ou de esquerda, ou qual é a diferença na prática para o cidadão comum, viver num sistema político em que o social se sobreponha ao capital, é, na certa, obter como resposta um roteiro de filme cômico, ou de programas de pegadinhas, onde todo mundo demonstra certeza para não confessar que desconhece totalmente do que se trata.
Ou seja, um movimento tão heterogêneo e sem um norte filosófico e político não tem como crescer. O que podem, e deveriam fazer seus dirigentes, pelos menos aqueles da vertente democrática, é buscar abrir uma discussão para acompanhar as denúncias de corrupção englobando todo e qualquer partido, empresários e as grandes empresas midiáticas. Expandir o foco. A culpa nunca pode ser exclusivamente de um único ator. Elementar meu caro Watson.
As cartas estão na mesa. As denúncias estão na internet pra quem quiser ver. As notícias a respeito se multiplicam todos os dias. Não poupam donos das maiores fortunas do país, famílias aristocráticas ou nem tanto, as presidências da Câmara e do Senado Federal, senadores, deputados, empresários das maiores empreiteiras do país, juízes, ex Presidente da República e ex candidato à Presidência da República.
As minguadas manifestações do dia 12 traziam muitos cartazes sobre “petrolão”, mas nenhum sobre as contas secretas no HSBC da Suíça ou sobre as recentes descobertas de sonegação da Operação Zelotes da PF provando que grandes empresas e milionários brasileiros sonegaram impostos depositando dinheiro lá fora ou subornando conselheiros do CARF/Receita Federal para burlar o fisco.
Por que é que os movimentos de rua de classe média não pedem a cassação de Eduardo Cunha e de Renan Calheiros, os dois citados nas denúncias da Operação Lava Jato?
Por que é que a imprensa prefere vender a imagem de Eduardo Cunha como o homem que fez o Congresso voltar a funcionar, mesmo votando leis retrógradas como a precarização da legislação do trabalhador terceirizado, em regime de urgência?
Simplesmente não pedem, porque a metade quer o mesmo que ele quer; derrubar Dilma ou sangrá-la para tomarem o poder em 2018; e a outra metade não pede porque simplesmente ignora o jogo de cartas marcadas que ele joga, e servem apenas de papagaios de piratas, repetindo a história mal contada e infundada que lhe vendem sem buscar a origem e as razões por detrás da notícia ou dos fatos.
Numa coisa os manifestantes se igualam: incorporaram a idéia difundida pela estratégia da direita, seja ela PSDB, PMDB, Democratas, PSB, etc, de que a culpa de tudo é do PT, do Lula, da Dilma, e que a solução é tira-la da presidência, via impeachment; ou mantê-la mas impedir que governe; ou dificultar tanto seu governo que, em 2018, desta vez sim, finalmente, consigam de novo tomar o poder para instituir novamente apenas a defesa dos interesses das elites dominantes deste país.
É urgente que seja aberta esta discussão na importância que lhe cabe sobre a necessidade de uma reforma política que ataque as bases da corrupção, alimentada no Brasil fortemente pelo financiamento privado de campanhas políticas.
Para crescer, no entanto, o movimento popular no Brasil deve abandonar as práticas hipócritas em que os dirigentes deturpam a história e convencem seus seguidores de que o inimigo está sempre do outro lado. No Brasil o perigo está na desunião dos iguais e muitas vezes dentro de casa.
Quando você ensina seu filho a faltar a escola e dizer que estava doente você está ensinando-o a mentir. Quando você diz que é bonito tirar vantagens no dia a dia, não devolver um objeto perdido, não pagar quando bate o carro num acidente de trânsito, não declarar à Receita Federal um rendimento extra você está ensinando a ele a ser um corrupto quando crescer.
Quando você aponta o dedo para o PT, prende seus integrantes, mas ignora todas as denúncias e indícios existentes contra Aécio Neves, na Lista de Furnas; não toma conhecimento dos nomes dos correntistas do HSBC, do Swissleaks – as grandes fortunas do Brasil, dentre elas os proprietários das grandes empresas de comunicação deste país, você, cidadão, está sendo parcial, está sendo hipócrita, está ajudando a construir um futuro podre para todos nós.
O recado imprescindível que devemos passar neste momento importante da história do Brasil é: ditadura nunca mais; respeito à Constituição brasileira e as normas jurídicas do país; combate à corrupção venha ela de onde vier; união de forças para garantir a aprovação no Congresso de pontos importantes para a radicalização da nossa democracia como uma reforma política que contribua realmente para o fim da corrupção.