Agosto: vitória da democracia ou do retrocesso?

Há exatamente um ano, escrevi o  artigo “Agosto, uma prova de fogo para o Brasil”.

Espécie de presságio para este agosto de 2016, eu dizia que apesar da beleza estonteante dos ipês amarelos num Planalto Central de céu azul, agosto seria amargo como o fel para o Brasil e funcionaria como um teste para a estabilidade de nossas instituições.
As máscaras tucanas e peemedebistas começavam a cair e não se preocupavam mais em esconder a participação ativa na formatação do golpe.

Aécio Neves em veiculações de 30s na tevê convocava ‘os indignados’ com a crise a participar da manifestação nacional marcada para a segunda quinzena de agosto e o vice-presidente nacional do partido, Alberto Goldman, cuspindo em suas origens comunistas, afirmava sem rodeios que era preciso “encontrar o caminho” para tirar Dilma da presidência.

Tentaram de todas as maneiras. Das mais espúrias as mais aparentemente “legais”. Buscaram encontrar o caminho mais curto para o golpe, via TCU, via STE, via manifestações nas ruas. Com a ajuda, inclusive dos fascistas movimentos que pregam a volta da ditadura militar.

Tentaram envolver Dilma no Petrolão, em Pasadena, em denúncias da Lava Jato, tudo com a ajuda incondicional da grande mídia e de uma direita altamente articulada no Congresso Nacional sob a batuta de Eduardo Cunha para impedir a aprovação de toda e qualquer iniciativa positiva para a governabilidade do país.

Seguindo um roteiro que todos os brasileiros acompanharam passo a passo, os golpistas acabaram montando um processo de impeachment onde acusam Dilma de ter cometido  crime de responsabilidade –hipótese prevista pela Constituição para o impeachment de um presidente da República – pela ocorrência das chamadas “pedaladas fiscais” em seu governo.

Na histórica e internacionalmente ridicularizada votação do impeachment na Câmara, onde os deputados do sim votaram em nome da mãe, da madrinha, do cabelereiro, do torturador, etc, o processo foi aberto após defesa feita por uma até então obscura advogada que gritava e rodava tresloucadamente a bandeira nacional como se em transe estivesse, falando em nome de Deus e do diabo.

A farsa mais tarde se repetiu no Senado e Temer e sua turma de corruptos tomou de assalto o poder.

Vazamentos de gravacões telefônicas entre os golpistas derrubaram ministros e convenceram  o Brasil que o golpe foi dado como única fórmula de salvarem suas peles e governarem o Brasil sob a ótica de interesse das elites.

Estamos nos acercando de um novo agosto. Aquele falava de um possível futuro de alienação dos princípios constitucionais, mas era visto a distância.

Um ano depois, este agosto fecha um ciclo e a Nação brasileira se encontra diante de um impasse: agosto de 2016 nos levará à restauração da democracia ou à legitimação do golpe ?

O golpe parlamentar foi provado. Não houve pedalada. Se nunca houve crime de responsabilidade que justifique o impeachment de Dilma Rousseff, só resta ao Senado arquivar o processo.

Isso se os senadores da Casa fossem homens íntegros e respeitassem a Constituição e a democracia.

Mesmo diante dessa situação concreta, nem uma só manchete de primeira página foi dada pela grande mídia golpista a respeito da decisão de arquivamento do Ministério Público Federal sobre as pedaladas fiscais.

A sentença do Tribunal Internacional pela Democracia no Brasil – composto por juristas de vários países reunidos no Rio de Janeiro por dois dias para julgar a legitimidade do processo de impeachment de Dilma Rousseff – corroborou a versão de golpe de estado.

Segundo a decisão, o processo de impeachment deve ser anulado porque nos termos da decisão de sua admissibilidade pela Câmara dos Deputados e do parecer do Senado Federal, o processo viola todos os princípios democráticos e da ordem constitucional brasileira; da Convenção Americana de Direitos Humanos; e do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos.

A verdade nua e crua é: os golpistas não acenam com a intenção de retroceder. Mesmo que na prática não tenham conseguido comprovar o envolvimento de Dilma ou Lula em denúncias de corrupção, e muito menos a existência de pedaladas fiscais, seguem com a sanha dos predadores, e a cada dia dão um novo passo na direção do desmonte das conquistas dos governos petistas.

O pesquisador e professor da Unicamp Laymert Garcia dos Santos afirmou em contundente entrevista que o Brasil não passa somente por um golpe de Estado, mas já vive um Estado de Exceção e um momento muito parecido com a queda da República de Weimar e a ascensão do nazismo.

Segundo ele, uma das principais características importantes dessa implosão das instituições, nos anos 20-30, na Alemanha, foi o modo como os juízes violavam a lei e a Constituição, e é exatamente o que está acontecendo aqui”, afirmou ao Jornal da Unicamp.

O professor tem toda razão. Vivemos sob um governo interino golpista que dá condições  cada dia mais a um estado de exceção.

A partir do momento, por exemplo, que o telefone de Dilma Rousseff é grampeado com autorização de Moro, ou seja, por uma instância inferior da Justiça, e a divulgação do grampo é   permitida, a conclusão imediata de qualquer brasileiro será: se a Constituição não está valendo para a presidente da República, para quem mais vai valer?

Ninguém está seguro neste país. É isso o que queremos para o Brasil? É isso que vamos permitir que aconteça e passe a ser a rotina para todos os brasileiros?

Ou vamos nos manifestar diariamente diante do Senado, fazendo um corpo a corpo com os senadores lembrando-lhes que a base jurídica do impeachment foi derrubada e que nenhuma razão política pode ser maior do que o respeito integral à Constituição e  ao voto de 54 milhões de brasileiros ?

Ou vamos nos unir, todas as categorias de trabalhadores, movimentos sociais da cidade e do campo, estudantes, intelectuais, movimentos de base da Igreja e a população em geral numa greve geral que imobilizará este país de norte a sul num grande Fora Temer e em respeito à Constituição deste país?
A hora é essa. O momento da decisão não se pode fazer esperar.
Agosto de 2016 entrará para a história como marco da vitória da democracia ou do retrocesso da história do Brasil ?
Cabe a nós decidir, brasileiros, homens e mulheres, que lutamos durante anos para derrubar a ditatura militar; para conquistar uma Constituição cidadã; para diminuir a brutal desigualdade social que nos assolava; e para nos governos petistas iniciar a transformação de um Brasil visto como país subdesenvolvido para uma imensa e respeitada Nação aos olhos do mundo.

Chico Vigilante

Deputado distrital do PT